COP30 24/10/2025

Do campo às cidades: como o Brasil pode se adaptar à mudança climática

“Os extremos climáticos causam no Brasil perdas anuais bilionárias, matam gente, sacrificam a vida de pessoas e poderá levar milhões à pobreza extrema antes de 2030”, afirmou a diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Prates, no painel “Do campo às cidades, quais as soluções para se adaptar à mudança climática”, realizado em 23 de outubro, como parte do seminário “Resiliência climática: o desafio da adaptação às mudanças do clima”, promovido pelos jornais O Globo e Valor Econômico e pela Rádio CBN.

Com mediação da jornalista Daniela Chiaretti, o encontro reuniu, além de Claudia Prates; Inamara Melo, diretora do Departamento de Políticas de Adaptação e Resiliência da Secretaria Nacional de Mudança do Clima (MMA); e Valéria Braga, do ICLEI (organização não governamental internacional que promove o desenvolvimento sustentável), em uma conversa franca sobre os caminhos do Brasil para enfrentar os efeitos das mudanças do clima, do campo às cidades.

“O custo da inação é de R$ 500 bilhões”

A diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Prates, trouxe ao debate uma visão prática e contundente sobre o papel do setor de seguros na construção da resiliência climática. “O Brasil sempre foi abençoado por Deus e bonito por natureza. Só que a natureza está respondendo aos efeitos das mudanças climáticas”, disse, lembrando que o país já enfrenta aumentos de temperatura superiores a 1,5°C em algumas regiões.

Segundo ela, as perdas econômicas provocadas por desastres climáticos no Brasil chegaram a R$ 500 bilhões nos últimos dez anos “Perguntar qual é o custo da inação é começar por aí. E quem paga somos nós, contribuintes”, afirmou.

Claudia explicou que, embora o mercado brasileiro de seguros seja expressivo, sua participação, comparada a outros países mais desenvolvidos, ainda é baixa, especialmente entre residências e pequenas empresas. “O seguro não é um custo, é uma proteção. Ele é o que permite à economia se recuperar mais rapidamente após uma catástrofe”, destacou.

Para Claudia Prates, o seguro pode ser um aliado estratégico da adaptação climática, oferecendo tanto proteção financeira quanto informações para prevenção de riscos. “O setor segurador pode apoiar municípios e estados, ajudando a identificar, mitigar e proteger contra riscos”, afirmou.

Ela lembrou que países como Chile e França já adotam modelos em que governos e seguradoras compartilham a cobertura de grandes eventos climáticos. No Brasil, esse tipo de estrutura ainda é incipiente, mas há espaço para inovação.

Um dos exemplos citados por Claudia foi a proposta da CNseg de criação de um seguro social de catástrofe, acoplado à conta de luz, que permitiria indenizar famílias diretamente em casos de desastre. “A solidariedade tem que ser pensada. Temos que nos adaptar e pensar nas pessoas, para que saibam que podem contar com uma segurança quando perderem tudo.”

Ela defendeu ainda que a reconstrução de áreas atingidas, como as do Rio Grande do Sul em 2024, seja feita com base em dados de risco, evitando que novos empreendimentos sejam erguidos em locais vulneráveis. “A reconstrução precisa ser feita em novas bases, para evitar que os acidentes voltem a ocorrer e o governo tenha de se endividar novamente”, alertou.

Governo prepara plano nacional de adaptação

A diretora do Ministério do Meio Ambiente, Inamara Melo, apresentou o Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima, que está sendo reformulado e ampliado com a participação de 25 ministérios e 16 planos setoriais. “Temos mais de 300 metas de adaptação e cerca de 800 ações em todas as áreas. É uma agenda ampla e absolutamente relevante para um país com tanta desigualdade e vulnerabilidade socioambiental”, disse.

Ela lembrou que 84% dos municípios brasileiros foram afetados por desastres nos últimos dez anos e que, sem ações concretas, o Brasil pode perder R$ 17 trilhões no PIB até 2050. “A adaptação precisa ser vista como política pública e social, não apenas ambiental”, afirmou.

Governança e soluções locais

Representando a sociedade civil, Valéria Braga destacou o papel das cidades e da governança integrada. “O ICLEI trabalha com 2.500 municípios no mundo inteiro, apoiando governos locais com planos de ação climática, de redução de risco e de arborização urbana”, explicou.

Ela citou o exemplo de Niterói, primeira cidade brasileira a criar uma secretaria de clima, após o desastre do Morro do Bumba, em 2010. “Foi preciso um desastre para acordar da necessidade de implantar uma série de coisas”, contou. Para ela, o caminho passa por soluções baseadas na natureza e por políticas urbanas integradas. “Adaptação é uma estratégia e ela tem que ser coletiva, coordenada e sustentável.”

Dados, educação e cooperação

As participantes convergiram sobre a importância de dados confiáveis, planejamento urbano e educação ambiental. Inamara Melo apresentou o programa Adapta Cidades, que deve alcançar 600 municípios até 2028 e 2 mil até 2035, capacitando gestores e facilitando o acesso a financiamento. “Essas informações já estão públicas na plataforma Adapta Brasil. Agora, precisamos capacitar gestores para que saibam o que fazer com elas”, explicou.

Claudia Prates completou: “Educação ambiental e educação para desastres precisam começar na escola. O Brasil está sujeito a ondas de calor e não está preparado para isso. Há mais de 500 mil escolas sem climatização. Adaptar é também cuidar da saúde e da segurança das pessoas.”

Caminho para a COP30

Encerrando o debate, Claudia Prates lembrou que o setor segurador estará presente na COP30 com a Casa do Seguro, espaço dedicado a temas como longevidade, saúde, mitigação e adaptação climática. “A mudança do clima já aconteceu. Precisamos estar preparados. A transição justa fala sobre pessoas, e a adaptação também. O seguro pode ser um pilar dessa transição”, afirmou.

Inamara Melo ressaltou que a presidência brasileira quer fazer da COP30 a “COP da implementação”, transformando planos em ação. “Já sabemos o que precisa ser feito. Agora é hora de pôr a mão na massa”, disse.

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